domingo, 24 de agosto de 2008

Notícias Lusófonas

© Soaroir de Campos

· Quem não estiver em dia com o português é automaticamente eliminado de alguns vestibulares, especialmente no da FUVEST. Como um exercício de treino eu transferi para o meu filho, candidato a uma vaga de engenharia química em 2009, a incumbência desta crônica:

"Simulado de Português

· A Internet da nossa geração está sofrendo de um sintoma proveniente da evolução do capitalismo – se é que capitalismo evolui - : “Tempo é dinheiro”. As pessoas estão economizando letras para dizer o máximo, com o mínimo de caracteres. Anteriormente era elegância obrigatória um RSVP, e algumas abreviações de tratamento. Depois do ASAP o analfabetismo aumentou consideravelmente. Sendo a maioria das abreviações e siglas globalizada, já falamos um outro idioma.

· Entre em uma sala de bate-papo, por exemplo, ou num MMORPG (já começa aqui), e preste atenção:
Dois amigos se encontram num jogo:
- E aê? Td em cima?
- Tudo. O q vc tá fzndo?
- Tô fazendo MM. É minar no RE e ir direto pro GE.
- Afe! Pq ir direto pro GE? IMHO, vc deve dexar no banco, e pegar td depois.
- LOL. Verdade... Axo q vou fazer isso sim.
- ROFL.

· Não fosse suficiente o sem número de siglas oficiais que temos que decifrar, hoje as abreviações vão desde siglas utilizadas entre os conclaves e clãs entre os gamers, até um e-mailzinho de pouca importância. Ante a toda essa escrita resumida muita gente se sente decifrando antigos códigos secretos de guerra ou a pedra de Rosetta.

· Já que estamos criptografando tudo, por curiosidade, bem como para me atualizar, examinei uma página da Internet que fala sobre métodos de criptografia, AKA “Elite Speech”. Comparado ao “Enigma” que tentava decifrar os códigos alemães na WWII, essa Elite Speech, ou LEET é praticamente indecifrável. É aquela em que se substituem letras por números e símbolos. Por exemplo, “Ordem e Progresso”, ficaria algo como: “0R>3\/ 3 .>R06R3220”. Imaginem isto na nossa bandeira...

· Até entendo o porquê dessa mania de se expressar rapidamente. Há determinados momentos em que se torna necessária a comunicação instantânea, principalmente na Internet onde tempo é realmente dinheiro. O problema é quando ela não é necessária e acaba por excluir os NOOB’s que não entendem do que se está falando e são reprimidos por perguntar - e aí recebem um VSF. Acredite, já fui vítima disso.

· BTW, vítimas das siglas é o que não faltam. Muitos sistemas de conversa têm filtros que impedem o chamamento de nomes feios, mas os letrados na arte de siglar conseguem burlar os filtros. Um manda o outro FY, e este por sua vez fica rindo achando que foi cumprimentado e ainda responde com um TYVM.

· Eu estou para entrar na faculdade agora. Será que num futuro próximo terei que reavaliar meus conhecimentos de comunicação para poder me formar? Professor Pasquale que se cuide!
CYA L8R,
Tucalipe. 24/8/2008

FYI:
MMORPG = Massive Multiplayer Online Role Playing Game
MM = Money Making
RE = Rune Essence
GE = Grand Exchange
IMHO = In My Humble Opinion
LOL = Laughing Out Loud
ROFL = Rolling On the Floor Laughing
ASAP = As Soon As Possible
AKA = Also Known As
WWII = World War II
LEET ≈ Elite
NOOB ≈ Newbie = Novato
VSF = Vai se F****
BTW = By The Way
FY = F*** you
TYVM = Thank You Very Much
FYI = For Your Information
CYA L8R = See You Later”

· Diante do exposto, até segunda ordem, fica revogado o regulamento do tempo que meu filho passa teclando. SYS (see you soon)
Soaroir de Campos
Agosto/2008

Essa Tal Mania de Viver

By Soaroir 24/8/08


Se viver fosse um acesso de veneta, vá lá. Não é o caso. Não vou, mesmo porque não sei, entrar no mérito da criação, tampouco me enfronhar em princípio de organização dinâmica, diretor e avaliador que determina as vivências e atos do indivíduo. Egos e superegos esta mini-crônica não cobrirá. Na minha simplória opinião, a culpa, se é que existe alguma, deve ser daquele tal de Cupido que emaranha vida, amor e existência.
Essa tal mania de viver pode ser vista de vários ângulos. O meu, olhando para o lado real, tudo depende em que parte do Globo se vive. Por exemplo, na Indonésia, 1 Real compra 5.630,36 Rúbias, já em Chipre, dá para comprar 0.24 de Libra CIP.¹
Livre arbítrio à parte, tem gente que diz que não basta existir e que é preciso viver e que para isso tem-se que ser humilde para reconhecer a própria ignorância e ser um eterno aprendiz. Convenhamos: deve ser (um pé) desesperador para um aluno saber que nunca sairá do banco da escola, principalmente se ele entender que, assim que começar a se alfabetizar na vida, ele morre e, nada, absolutamente nada do que assimilou lhe servirá depois de morto. A não ser que o discípulo acredite em reencarnação. Ele foi um faraó antes, e seu barco ficou a deriva e anda perdido por aqui, ao invés de ter ido se juntar aos deuses. Caso contrário, de pé ou sentado, virando cambota ou pendurado, vamos vivendo. Como prever o futuro é muito difícil, mais ainda controlá-lo, vamos escrevendo. Pelo menos assim somos o sujeito da história.



Continuação/resposta a mini-crônica do Yuri
in: http://recantodasletras.uol.com.br/forum/index.php?topic=4112.0


¹ http://www.bc.gov.br/htms/bcjovem/moedasmundo.htm

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

J’accuse...!

(Crônica dos Ceguinhos)


By Soaroir 21/8/08

Diferentemente do de Zola, este título não origina nenhuma carta, embora pudesse ser enviada a algum chefe do governo. Foi forte a emoção que senti ontem enquanto atravessava a Av Paulista com a Av. Brigadeiro Luiz Antonio. Realismo puro, sem tirar nem pôr.
Cego, digo, deficiente visual que se preza não aceita piedade nem para atravessar a rua. O que é muito justo, pois somos todos diferentes e temos que aprender a nos virar sozinhos com as nossas deficiências, sem ter que depender de caridades. Somos, em primeiro lugar, gente, e cidadãos que, independentemente de nossas penas, pagamos o pato.
Saindo da rua Manoel da Nóbrega, vitoriosamente, respira aliviada uma bengala que em seguida tateia as grades de proteção que anteparam as pistas seguintes. Dá daqui, dá de lá, até que uma transeunte segura no braço do rapaz portador da bengala branca. Mas ele dá de ombros e solta um tipo de muxoxo. A moça encabulada desiste e o moço desce um degrau e vai se metendo entre os carros enquanto a multidão ao redor grita: - “Pare, pare!” Este, visivelmente desorientado, retrocede e continua batendo a bengala para entender aquela diferença de níveis e descobrir o local de travessia. Então, eu, de braços cruzados, me aproximei. – “Precisa de ajuda para atravessar a Avenida Paulista?” Sequer toquei em seu braço. Lição dos dias de trabalho junto a sra Dorina Nowill, Laramara e Instituto Padre Chico, quando aprendi algumas técnicas para me aproximar de um deficiente visual sem causar melindres.
Ai, ele é que me pareceu encabulado.
– Faz tempo que não venho por aqui.
– É, estão modernizando tudo por aqui - comentei. O farol abriu e verbalmente eu fui indicando a direção para que ele pudesse acertar aquele vãozinho de aproximadamente um metro, entre as “barricadas” do canteiro central.
Ele me parecia um tanto nervoso, e não era pra menos. O cidadão quase fora atropelado após recusar ajuda e não acreditava que tudo que ouvira sobre a reforma da paulista, conforme me revelou enquanto andávamos, não atendesse às necessidades de um deficiente visual.
– “A avenida de cara nova... Onde estão as inovações tecnológicas para o conforto e acessibilidade?”, arrematou o jovem, assim que atravessamos a avenida e ele me perguntar se o ponto de ônibus estava para a direita ou para a esquerda.
E eu, que passo por lá toda a hora e nunca me dei conta da dificuldade que aqueles desníveis e estreitas passagens causam a um deficiente visual, resolvi pesquisar. E não é que está tudo lá no “CENTROSP”!:



A Paulista de Cara Nova
Avenida terá calçadas, canteiro
central e paisagismo refeitos da Praça Osvaldo Cruz até a rua Consolação.
Quase 30 anos depois, a Avenida Paulista começa a ser revitalizada a partir
da substituição de suas calçadas, hoje remendadas e danificadas pelo tempo. O
novo piso será feito com o que há de mais moderno em tecnologia de construção:
pavimento de concreto moldado no local, com juntas de dilatação em latão. Além
do padrão estético - destacado pelo contraste das tonalidades do concreto,
grafite e natural, com o dourado das juntas metálicas -, a opção por este
material levou em conta a durabilidade, a facilidade de manutenção e o conforto
para caminhar. Será também a primeira avenida da cidade a ter acessibilidade
total, com a instalação de 200 rampas. O canteiro central e os jardins também
serão renovados.”.



E etc. Por tudo isso eu acuso os homens de pouca fé por suas (toda essa) displicências.



¹ Émile Zola
Paris, abril 1840/setembro 1902.
Idealizador e principal expoente
do naturalismo na literatura.