quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Patéticos Anônimos - Releitura

Nunca viciei em coca-cola ou levei coleção alguma a sério. Depois de uma cerveja, o que mais gosto é pastel de feira e caldo de cana, que remetem à minha infância na Usina Ururaí.
De resto, sempre fui alegre e esfuziante, embora, ultimamente, venha tentando me conter diante de certos excessos, embaraços, talvez, algum ciúme, e mesmo da inveja que provoco nos circunscritos; quando aceitam meus modos e minhas modas me recebem como alguém fora da ordem mundial; será?
“Entre os ingleses aja como um.” Ou algo assim. Não lembro se mais alguém disse isso, mas ouvi do meu filho quando fui visitá-lo em Cambridge, logo depois de encontrar o Nick na hora do break num coffee shop lotado de aspirantes à PhD.
Por duas semanas o Nick foi nosso hóspede aqui no Brasil e como um bom inglês, acredito que traduziu bem a fala “When in Brazil act like one” e a impressão que deixou por aqui foi de um rapaz expansivo e carismático.
Os ingleses, em sua maioria, são cheios de energia e animação, mas nada de abraço apertado e beijinho dobrado, como eu, de braços abertos num soprano alto, demonstrei toda minha alegria em revê-lo:
“Hi, Nick! What a nice surprise seeing you again...”
Só mais tarde percebi o mico. Primeiro “Hi” não poderia ser surpresa, já que sabia que o moço estudava lá, e segundo... Bom, nem é preciso contar!
Esta ocasião, entre tantas, em que minha natureza esfuziante foi implacável, estava esquecida dentro de algum compartimento de memória provavelmente do tipo “Inspiração Divina” junto de remorsos e desigualdades.
Até que o colega de letras Bancalero sugeriu o mote de poesia: “Tantas coisas para lembrar – Tantas coisas para esquecer”; e revirando a “Inspiração Divina” me dei conta de, que sim, sou patética, mas não estou só – somente o é aquele que por compromisso com a censura vive a emoção de cada momento, pelos olhos daqueles que ainda não aprenderam a vivê-la.

domingo, 18 de outubro de 2009

APatA

ou Ass. dos

Patéticos Anônimos
Soaroir 18/10/09

Nunca me viciei em coca-cola ou levei alguma coleção a sério. Depois de uma cerveja, o que mais gosto é um pastel de feira, e caldo de cana que me remete à minha infância na usina Ururaí. De resto sempre fui uma pessoa alegre e esfuziante, embora com o tempo venho tentando me conter, diante de certos embaraços, ciúmes e até inveja que causo nos circunscritos que, quando me aceitam, me recebem como um ser fora da ordem mundial.
♦“Entre os ingleses aja como um” ou algo assim. Não me lembro se mais alguém já disse isso, mas ouvi do meu filho em uma das vezes em que fui visitá-lo em Cambridge, logo depois de encontrar o Nick na hora do break, na cafeteria lotada de aspirantes a PhD.
Por umas duas semanas o Nick foi nosso hospede aqui no Brasil e como bom inglês acredito que traduziu a fala When in Brasil act like one e a impressão que deixou por aqui foi de rapaz expansivo e carismático.
A maioria dos ingleses é cheia de energia e animação, mas nada de abraço apertado e beijinho dobrado como eu, que de braços abertos e num soprano alto demonstrei a minha alegria em revê-lo: Hi Nick!, what a nice surprise seeing you again...
Só mais tarde percebi o mico. Primeiro "Hi" e não poderia ser surpresa já que eu sabia que o moço estudava lá e segundo...Bom, nem é preciso contar!
Esta, entre muitas outras vezes em que meu esfuzio foi implacável, estava esquecida dentro de algum compartimento provavelmente do tipo “Inspiração Divina” junto de remorsos e desigualdades até que o colega de letras Bancalero sugeriu o mote de poesia Tantas coisas para se lembrar -Tantas outras para se esquecer que revirando o compartimento “Inspiração Divina” me dei conta de que sim sou patética, mas não estou só - somente o é aquele que sem compromisso com a censura vive a emoção de cada momento, aos olhos daqueles que ainda não aprenderam a vivê-la.

sábado, 3 de outubro de 2009

Esqueletos

►Deveria existir um manual para se lidar com fantasmas, principalmente os que se apresentam em noites de insônia.
►A maioria deles tem predileção por interferir em forma de pesadelo assim que se começa a cochilar; outros preferem abrir porta de armário e até dominar o controle remoto da televisão.
►Desde dos anos 50 quando a Zenith Radio Corporation criou o primeiro controle remoto até o atual desenvolvido pela ITT Corp., que os insones são cada vez mais dependentes compulsivos do telecomando. Com ele criamos uma rotina paliativa que distrai a expectativa de dormir, embora os médicos aconselhem aos insones ficar longe de bons livros, bebida, cigarro, e principalmente que retirem a televisão do quarto. “Se estiver passando algum programa interessante, será difícil conseguir começar a dormir ou continuar o sono interrompido. Para alguns a televisão é hipnótica.” Eu acrescentaria retirar também o relógio, que a meu ver é um grande responsável pela manutenção da dona insônia. E caso a televisão permaneça no quarto, aviso que é de extrema importância manter o controle remoto fora do alcance de fantasmas.
►Com a pobreza de programação, em especial a noturna, não há muito o que escolher para assistir quando chega a insônia. Basta sintonizar em um canal de música ou no “Animal Planet” e ficar com o controle preparado para diminuir o som quando entrar o “reclame” a fim de não acordar a vizinhança. E assim, de acordo com a leveza do ser, programa-se o “sleep” e com a vigília distraída ela perde importância e sem stress se acaba adormecendo. Isso quando não se tem interferência do além, como me aconteceu esta noite.
►De repente a televisão entrou em modo de vídeo com um chiado infernal. Nenhum comando respondia no controle remoto. Como alternativa fui até a tv e passei para o modo TV e voltei para a cama. Assim que me deitei o volume foi ao máximo e nada de controle. Novamente de pé resolvi abrir o controle para trocar as pilhas. E quem disse que eu conseguia abrir aquela tampinha das pilhas?
►Dei um tapinha de leve, usei a ponta da caneta, um grampo de cabelo e nada. Como já passava das cinco e a minha irritação de mil, joguei o controle na parede para acabar com o problema. Foi quando a televisão que eu havia desligado ligou sozinha no seriado “Fear itself”.
►Restaram os esqueletos, do controle e desta que, com menos uma noite de sono, acaba de narrar o causo do “o assombroso caso do controle remoto”.

Soaroir de Campos

São Paulo - SP
03/10/09

(The only thing we have to fear is fear itself.
“A única coisa que temos que temer é o próprio medo".
Frase atribuída a Franklin Roosevelt)

segunda-feira, 13 de julho de 2009

...quando ela envelhecer

Crônicas de Soaroir
http://socronicas.blogspot.com/
Julho 2009



imagem/net/mabels




Ando muito injuriada e não é pela minha idade, mas pelas porcarias que fazem, e escrevem sobre os velhos. Tem uns “sem noção” que provavelmente mesmo velhos não sejam suficientemente vividos para falar da nossa realidade e ficam se achando. Criam grupos disso, daquilo para projetar sabe-se deus quem ou o quê, e entre estes estão os dos “idosos” .

Outro dia (crônica à parte - “Legalmente Velha”) o meu porteiro ligou para avisar que havia chegado o meu cartão “do idoso”. Sim, por que vem escrito em negrito logo depois do destinatário.

Mas hoje a minha paciência levou à breca.(¹) Enquanto tentava, inutilmente, descobrir uma matéria que não pude acompanhar às 7:45 de hoje num determinado canal que anteriormente anunciara falar sobre as benesses da internet para incentivo à leitura bem como aos novos escritores, deparei com a seguinte “headline”

“Sábado, 11 de Julho de 2009
Vida depois dos 60 anos
O trabalho voluntário do Grupo Vida é proibido para menores de 60.”

Embora o meu oficio de escrever seja mero laboratório para desincrustar minhas antigas bactérias, não entendi muito bem a manchete.

Entre outras anomalias lá estava: “Aqueles que não conseguem mais ficar de pé, dão um jeitinho para balançar no ritmo do forró” Puxa vida...! (para não dizer outra coisa)

Tudo bem, “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”, mas cá entre nós: levar música, de forró, para pessoas idosas, entre as quais algumas sequer mais conseguem ficar de pé é violência, uma afronta, para não dizer sacanagem. Isso é provocar, categorizar o próximo da sua mais íntima miserabilidade, que é a capacidade de movimentos, forçando-o a fingir que está gostando...

E outro dia?
Eu cheguei na dentista, aparentemente recém formada e já foi ela... “vai doer um pouquinho... vou dar uma anestesiazinha, abre a boquinha...” Ai eu me enfezei. Tirei aquelas porcarias da boca, me pus de pé e disse:
- Doutora, não me leva a mal, mas, primeiro não sou retardada, segundo já frequento dentista há bem mais de 50 anos e, pelo que me conste, ainda ministram ética em odonto. Resumindo - a pobre ficou roxa e mudou de tom enquanto extraía a raiz do meu dente.

Acho que caiba a nós, com mais de 60, educar, doutrinar essa turma que ainda não está familiarizada com a nossa geração e não permitir que as nossas carências e/ou consequências sejam confundidas com retardamento mental.

“Vida Depois dos 60 anos”... E antes? Que droga andamos nós fazendo por aqui? Estavamos mortos e não sabíamos? Quero chegar logo aos 90! Aos 90 logo...Reitero. Só para ver esta turma velha..., dançar forró.

Soaroir de Campos 11/7/09


(¹) bancarrota

(in loco p os céticos:
http://acao.globo.com/Acao/0,23167,GTS0-3776-61499,00.html)

domingo, 5 de julho de 2009

Legalmente Velha

(primeiro rascunho)
By Soaroir de Campos
05-07-09

◊ Receber na portaria do prédio uma correspondência ostentando, em negrito, um título, define um status e nos causa muito impacto. Dependendo do nosso momento, colabora, inclusive, para nos situar na realidade.
◊ Do registro de nascimento, passamos pelas cadernetas de escola, cartões de banco, de crédito, até àqueles pendurados no pescoço identificando-nos como “escritora”, nos caracterizando como cidadãos, conquistadores, ativos sujeitos inseridos no contexto de uma sociedade evoluída, os quais exibimos com orgulho.
◊ Com o tempo, os cabelos e os demais acessórios, aqueles vão perdendo a validade. O impressionante é que coincidem com o vencimento do passaporte, da carta de habilitação (CNH) e os utensílios domésticos.
◊ Do banheiro até a área de serviço, tudo começa a ruir. A princípio, muito naturalmente encarado. Os azulejos despencam, o colchão já era, a TV perde o contraste, aquele computador que uma vez fora de última geração e sacrificosamente adquirido no cartão de crédito já não gera memória suficiente para acompanhar a evolução.
◊ Para um moderno fogão que perdeu o acendedor automático não há mais peças para reposição. Igualmente para a lavadora que parou cheia de água e de pratos sujos. E a máquina de lavar então!? Um dia valiosíssima e autêntica White-Westinghouse, se derrama em óleo toda a vez que é obrigada a trabalhar a ponto de sair correndo, patinando pela área afora.
◊ Aí é hora de convocar uns pajés, que não distribuem cartões de visitas (mas que los hai, los hai) para nos benzer juntamente com a casa. Quando assombrosamente toca o interfone, e um jovem porteiro com uma voz regozijante anuncia:
― Dona Fanegundes, acabou de chegar o seu cartão do idoso.
◊ E ao rasgar o envelope, lá está um resumo de tudo, em cores vivas e indubitável fotografia, no último cartão que ostentaremos junto ao da assistência médica e o antigo RG:



terça-feira, 12 de maio de 2009

Comédia de Aniversário

"Stand-up Comedy"
Soaroir de Campos
9/5/09

“Bom Aniversário”
Alguém saberia me dizer o que realmente há de bom em fazer aniversário? O novo quer ficar mais velho e o mais velho... como todos sabem ... parecer mais jovem.
Na minha idade o que há de bom ficar mais velho, além de ter mais histórias desatualizadas para contar, mais revistas velhas, roupas apertadas e outros troços que fervorosamente prometemos terminar um dia, como a tapeçaria, ou sair da página 111 de “No Caminho de Swann”, por exemplo? Só os inusitados presentes.Comemorar aniversário é só mais um motivo para uns porres. Ambíguos e literalmente.
É surpreendente fazer aniversário no meio do mês, especialmente no meio do mês do meio do ano, quando o gerente do cheque especial já não é mais aquele tão gentil mediador quanto na época das “Boas Festas” e o nosso 13º salário.
Nasci em meio a foguetórios, bandeirinhas, procissões e ladainhas. 14 de junho –de um bom ano. Foi desde então que me especializei em pular fogueiras. Convenhamos que é uma data linda. Todos os caipiras reunidos tomando quentão e comendo bolo de fubá, pé-de-moleque e mandioca assada e portando debaixo do braço uma prenda de acordo com a ocasião e nunca com o aniversariante. Um chapéu de palha, um laço de fita vermelha para dar sorte, ou um tacho ou outros apetrechos para o quentão - que se fosse em outra época do ano seria para queijo e vinho.
Foi em um desses 14 de junho que por acaso entendi melhor a “stand up comedy”
Uma amiga da família que já não dança mais quadrilha e de “O Quatrilho”(¹) só se lembra de ouvir falar , embora ainda ande pulando fogueiras, arrastou pro lado uma das mesinhas e retirou do fundo de uma bolsa tipo embornal, um bloquinho e suas cartas de baralho. Ela parecia aqueles peixes que ficam de tocaia pela presa. – Vai um carteado aí? Uma tranca? Ela já estava arriscando até um bridge, mas nada – o forrô lá fora do salão do prédio estava mais animado. Para que seus baralhos não se tornassem os únicos donzelos /virgens da festa ela apelou. Chegou a mesa para um vão entre o bar e a mesa do bolo, adaptou o visual numa espécie de tenda e atacou: Leio sua sorte... Ela mal acabara a frase e uma fila se formou. Não ficou mulher com homem nem comigo, a aniversariante. Aproveitei para dar uma folga aos sanfoneiros, o que mais tarde eu me arrependeria profundamente.
Fiquei eu só entre os temporões pisando na grama e alguns pais gabolas. Um avô cortou a sequência daquele desfile de espermas premiados com um: - Legal, você nem aparenta ter a idade que tem. Ai eu craquelei... Se, sem bem saber a minha idade ele soltou uma dessa é porque ou esta festa de aniversário está um lixo, ou eu. – Pareço mais, já sei – tentei num tom de galhofa e não é que, no mesmo tom , o cretino confirmou!
Pouco a pouco, à medida que a fila na “tenda” da minha convidada quiromante ia se esvanecendo, uma “panelinha” ia se formando do lado esquerdo do terraço. Até que por ultimo apareceu a Cacilda, velha amiga de infância, com um semblante meio perdido. Apressei-me em sua direção e disfarcei: E aí? – Como fui a última da fila consegui um horário para a Sibila continuar lendo o meu futuro só para quando você completar setenta.
Que droga! Pensei. Como esses amigos assumem responsabilidades por nós outros?! Agora tenho que comemorar mais um monte de aniversário para não decepcionar-los !?... Haja gengibre...
Finalmente, estirada num sofá eu matutava: na outra encarnação quero nascer em Dezembro, pensava enquanto abria um presente solitário num canto. Era uma bolsa, legítima imitação de couro marrom. – Até que em fim um presente útil, e de minha irmã - pensava . Meti a mão no fundo e lá estava : MOD 977- CBA /MSCAR/TPA/NIQUE/CAC/PRTPR ao lado de um código de barra para eventual troca, logo em seguida um delicado cartãozinho:
“Querida chefe xx, nós da Cia xy lhe desejamos um Feliz Natal ...”
Ai ai ai caramba... Nunca trabalhei na xy, eu não me chamo xx... e hoje ainda é 14 de junho!!!

e.t: este é só um rascunho inicial - até breve